Resenha: Vigiar e Punir - Michel Foucault

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Olha, há alguns meses iniciei leituras mais selecionadas e afins da área que escolhi como futura profissão – advogado – e estou me surpreendendo! Confesso que pensei que seriam cansativos alguns títulos, difíceis (e são, rs), técnicos demais.... Me enganei total (93% segundo minhas estimativas na verdade)!  Vou logo adiantando: são livros de n´s releituras. A cada grau de maturidade e conhecimento que você atinge, um pouco mais você entende da obra e absorve de suas entrelinhas. Eu ainda não iniciei o curso, mas o que pude degustar e digerir de Vigiar e Punir já foi o suficiente par me fazer se apaixonar pela área – que julgo ter a ver com a temática do livro – de Direito Penal!
   Basicamente Foucault desenvolve uma genealogia do poder e das práticas punitivas. Isso seria como mostrar suas origens e todo seu processo de evolução. A metamorfose dos métodos punitivos. Começando pelo espetáculo quase teatral dos suplícios, que extrapola os conceitos de “tortura” ou “punição corporal” e tem como foco fazer o supliciado sofrer, atingindo não somente seu corpo (como antes pensado) mas também a sua alma. Numa escrita altamente descritiva, a irracionalidade daquelas práticas nada funcionais provoca no leitor sensações agonizantes. Ao analisar a prática do suplicio, temos que antes de tudo entender – ou ao menos tentar – as relações de poder que transmutam de tempos em tempos. Pois “o suplício não restabelecia a justiça; reativava o poder. ”

Um comentário que vi em muitas resenhas de obras e Foucault é que ele usa conceitos próprios e, entendendo a sua personalidade (o mínimo possível) facilitaria a leitura. Percebe-se também que foi feito um denso trabalho de pesquisa para o Vigiar e Punir, por meio de várias notas de rodapé, com uma gama de referências que às vezes toma metade da folha. Mas nada que atrapalhe!

“Na realidade, entretanto, o que até então sustentava essa prática dos suplícios não era a economia do exemplo, no sentido que isso será entendido na época dos ideólogos (de que a representação da pena é mais importante do que o interesse pelo crime), mas a política do medo: tornar sensível a todos, sobre o corpo do criminoso, a presença encolerizada do soberano. ”

Vale lembrar que no Antigo Regime a pena aplicada não dependia da intensidade do crime, até porque não se colocava graus nos atos ilícitos. O que mudou devido em grande parte aos personagens extrajurídicos. Muitas vezes o papel da vítima recaia no condenado, e o carrasco passava a ser visto como vilão da história. Então começaram as manifestações populares na segunda metade do século XVIII, contra os suplícios e a exigência de respeito, ao menos, a humanidade no condenado. O objetivo agora era fazer do culpado o arauto de sua própria condenação. Dublar a proclamação forçada da confissão pública com o reconhecimento espontâneo e público. Diferia-se também as intensidades de práticas criminosas. Toda essa mudança serviu como ponte para passagem de uma criminalidade de sangue para uma criminalidade de fraude. O que exigiu novos métodos de punição, levando à sua universalização.

“O castigo passou de uma arte das sensações insuportáveis a uma economia dos direitos suspensos. “

“Os criminosos do século XVII são “homens prostrados, mal alimentados, levados pelos impulsos e pela cólera, criminosos de verão”; os do XVIII, “velhacos espertos, matreiros que calculam”, criminalidade de marginais.”. Agora eu me arrisco a complementar essa colocação, dizendo que os criminosos do século XXI são homens de terno e gravata, letrados em sua maioria, fartos dos mais nobres alimentos e, pior, nossos líderes governamentais. Enfim. A obra continua falando sobre o momento em que a privação total ou parcial da liberdade do homem surgiu como punição. Como surgiu a prisão e como o papel de retribuição por parte do condenado a partir de trabalhos forçados ao governo exerceu um maior controle social.

“O essencial da pena que nós, juízes, infligimos, não creiais que consista em punir; o essencial é procurar corrigir, reeducar, “curar”; uma técnica de aperfeiçoamento recalca, na pena, a estrita expiação do mal, e liberta os magistrados do vil ofício de castigadores. ”

Então é isso! Não coloquei tudo que entendi dessa obra sensacional na resenha, apenas as partes mais memoráveis. Sobre a edição da linda da Editora Vozes, simplesmente maravilhosa e com uma excelência na diagramação e tradução sem igual. Tem várias páginas com imagens e cópias de documentos das fontes usadas por Foucault na construção de Vigiar e Punir. O livro é sim um pouco difícil de compreender, mas sua fluidez impede grandes desgastes. Uma dica é ler com dicionário ao lado, ajuda muito (Foi o que fiz).

Título: Vigiar e Punir
Autor: Michel Foucault
Editora: Vozes
Páginas: 302

Nota: 5/5

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