Resenha: Contra a Perfeição - Michael J. Sandel
13:17
A
ciência está avançando mais depressa do que a compreensão moral da sociedade.
“O que começou como a tentativa de tratar uma doença ou prevenir um distúrbio
genético, hoje acena como um instrumento de melhoria e uma escolha de consumo.
”. Em Contra a Perfeição: Ética na era da
engenharia genética o renomado filósofo, autor e professor na universidade
de Harvard, Michael J. Sandel, traz uma série de questionamentos e provocações
sobre os limites da moral na engenharia genética. Questões como o uso da bioengenharia
para usos não medicinais e sobre a clonagem de embriões para pesquisas com
célula tronco.
Se um atleta se machuca em uma partida de vôlei, e para reparar utiliza ajuda da terapia genética, porque é errado que esse atleta vá mais além com o tratamento de modo a não apenas cura-lo como também melhorá-lo? Sandel faz algo muito interessante em sua escrita, ele não explicita sua opinião de início, pondo o leitor a se questionar e procurar partidos nas discussões. Ele questiona se esses melhoramentos não seriam uma espécie de eugenia, e entra na questão da justiça e igualdade, pois os melhorados e os não melhorados teriam as mesmas chances no esporte, por exemplo? E as diferenças herdadas naturalmente pela loteria genética? Não já colocaria aspas na igualdade e justiça?
“Eis, portanto, a relação entre solidariedade e dádiva: ter um senso vívido da contingência de nossos dons – a consciência de que nenhum de nós é completamente responsável pelo próprio sucesso – impede a sociedade meritocrática de deslizar para a crença arrogante de que o sucesso é o coroamento da virtude, de que os ricos são ricos porque são mais merecedores do que os pobres. “
Outro
fato é que ele apresenta um ponto de vista, descreve possíveis falhas e
objeções no mesmo e também aponta defesas mesmo que não seja sua opinião. Por
exemplo: Ele crítica os defensores do status moral equivalente (que julgam um
embrião – blastocistos - ser o mesmo que uma criança já formada), daí ele fala
que o blastocisto é apenas um ser humano em potencial, assim como uma semente é
uma árvore em potencial e nem por isso choramos ou levantamos bandeiras quando
damos sementes para passarinhos comerem. Que nessa fase, cultivado em placa de
petre, o conjunto de 180 a 200 células, é ainda difícil ser visto a olho nu.
Mas ele também diz o que poderia acontecer caso passemos a ver a vida como algo
vindo do além e 100% manipulável, e não como uma dádiva.
“Essa
visão de liberdade, entretanto, é falha. Ela ameaça banir a valorização da vida
como dádiva e nos deixar sem nada para defender ou contemplar além da nossa
própria vontade. “
Então
os questionamentos giram basicamente em torno disso, melhoramentos genéticos e
uso de embriões excedentes ou clonados para pesquisas. Ele fez uma colocação bastante
incisiva. Se numa clínica de fertilidade houvesse um incêndio e você só tivesse
tempo para salvar uma menina de 5 anos ou uma bandeja com 20 embriões
congelados, seria errado salvar a menina? É meu amigo, esse livro da muito bug na mente. Logo ele começa a se
aprofundar na problemática e a ver a origem dos problemas. Deveria ou não
produzir embriões excedentes nas clínicas de fertilidade? As pesquisas com uso
de tais deveriam ser de cunho estatal? O peso moral de utilizar embriões
clonados com fins de pesquisas é menor?
“Ele rejeita com razão a visão
utilitária de moralidade, que pesa custos e benefícios sem se incomodar com a
inviolabilidade das pessoas. ”
Outro
ponto discutido é sobre o selecionamento de características do filho por meio
de terapias genéticas. Com todo avanço biotecnológico o que pode ser usado para
fins terapêuticos, também podem ir além, seja por vaidade ou ambição. Ferir o
direito à liberdade e autonomia de uma criança, escolhendo seu sexo, altura,
cor, QI, gostos e habilidades, é coloca-la subjugada à sombra de outra pessoa,
cultura e costumes pré-determinados. Há uma onda de pais projetistas, os
“Hiperpais”, que querem se espelhar ou realizar no filho suas vontades. Mas
isso de selecionar características nunca teve um fim bom na história, não é
mesmo? A velha eugenia, grande inspiração para os ideais nazistas, selecionando
os não qualificados e os eliminando.
“Um desses motivos é que a seleção do
sexo é um instrumento de discriminação sexual, tipicamente contra meninas. “
Se eu
fosse pôr aqui todos os debates do livro, seriam umas 10 páginas. Simplesmente
sensacional. Leitura fluida e de fácil compreensão e com muito fundamento
científico. Edição linda e minimalista.
Título:
Contra a Perfeição: Ética na era da engenharia genética
Autor:
Michael J. Sandel
Editora:
Civilização Brasileira
Páginas:
134
Nota:
5/5
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